domingo, 23 de outubro de 2011

Processo Disciplinar PMESP - Punição com base apenas na confissão do acusado


Continuando nossa postagem a respeito da punição disciplinar com base apenas em provas produzidas na Investigação Preliminar[1], vamos tratar, agora, da punição com base apenas na confissão do militar acusado.

Já apontamos aqui a similitude entre o Processo Criminal e o Processo Disciplinar, onde os princípios daquele se aproveitam no neste.[2]

No âmbito penal a confissão não é mais a rainha das provas, a confissão do acusado não constitui mais prova plena, ela deve ser confirmada por outros elementos contidos nos autos. [3]

“o princípio de que ‘confessus pro convictu habetur’ só vigora no processo civil” [4], pois neste o direito material é disponível. O mesmo não ocorre no âmbito do Direito Disciplinar Militar, pois aqui está em jogo a liberdade do acusado, direito indisponível.

Logo, para que a confissão tenha força de punir o acusado, ela deve estar corroborada por outros elementos de prova.

Neste sentido o CPPM:

“Art. 307. Para que tenha valor de prova, a confissão deve:
[...]
e) ter compatibilidade e concordância com as demais provas do processo.”

Também são neste sentido as orientações do anexo III à Portaria do Cmt G Nº CorregPM-004/305/01:

“Artigo 6º [...]


§ 2º - A ausência de requerimentos da defesa ou a confissão permitirá à autoridade competente passar diretamente à fase de julgamento, acarretando na imediata solução, observando-se, contudo, o disposto no inciso IV do artigo 8º desta norma.

  
Artigo 8º [...]

IV - o imperativo da busca da verdade real obriga a se considerar, em defesa do militar do Estado acusado, todo argumento que, por inépcia ou outra razão, não tenha sido usado, mas que seja de conhecimento.”

Assim, o Anexo III também estabelece que a confissão por si só não tem força suficiente para aplicação de punição ao acusado.

Portanto, a autoridade disciplinar não poderá fundamentar a punição apenas com base na confissão do acusado, devendo, neste acaso, arquivar-se o procedimento por falta de provas.


[1] http://barcellijuridico.blogspot.com/2011/10/punicao-com-base-apenas-em-provas.html
[2] Idem
[3] Fernando Capez, Curso de Processo Penal, 15ª Edição, São Paulo, Saraiva, 2008, p. 343.
[4] Fernando da Costa Tourinho Filho, Processo Penal, 23ª, São Paulo, Saraiva, 2001, p. 283.

quarta-feira, 19 de outubro de 2011

sábado, 15 de outubro de 2011

Punição com base apenas em provas produzidas na investigação preliminar

A Investigação Preliminar é um procedimento adotado pela administração militar quando há suspeita de cometimento de infração disciplinar, mas não existe, ainda, indício suficiente para instauração de processo disciplinar.

Assim, ao se deparar com uma comunicação disciplinar que não reúne condições para instauração de processo é comum que a autoridade disciplinar determine uma investigação prévia.

Neste caso também é comum que após a investigação a autoridade dispense a manifestação preliminar do acusado, pois entende que já existe indícios suficientes para promover a elaboração do termo acusatório e instaurar o processo disciplinar.

Ocorre que, aos moldes do Inquérito Policial, a Investigação Preliminar não possui contraditório, pois o oficial encarregado da IP irá ouvir testemunhas sem a participação do acusado, não será dado oportunidade ao acusado ou ao seu defensor de fazer reperguntas, o encarregado conduz o procedimento sem a participação da defesa.

Neste prisma, seria possível a punição do acusado apenas com base nas provas produzidas na Investigação Preliminar?
Dúvida não existe sobre a similitude do Direito Disciplinar com o Direito Penal e com o Direito Processual Penal.

Neste sentido:


“No caminho dos mais perspicazes, por conseqüência mais arrojados, citem-se as lições de Egberto Maia Luz que, a começar pelo título de uma de suas obras, nitidamente postula a diferenciação entre “Direito Disciplinar” e Direito Administrativo. Na construção do ilustre doutrinador, encontrar-se-á, por exemplo, a exaltação da proximidade do direito de punir da Administração com o Direito Penal e, conseqüentemente, do Direito Processual Administrativo com o Direito Processual Penal [...] “[1] (Grifei).

Assim diz a Constituição Federal em seu artigo 5º:


“LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;”

“LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;”

– grifei –

A Constituição vem nos informar que o individuo só pode ser punido se houver processo com provas produzidas sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, incluído aí o processo administrativo.

Por sua vez o CPPM estabelece:


Art. 297. O juiz formará convicção pela livre apreciação do conjunto das provas colhidas em juízo. [...] – grifei –


Note, mais uma vez, a Lei diz que a prova deve passar pelo crivo do contraditório e ampla defesa, é o que se depreendi da expressão “colidas em juízo”, não são aceitas aqui as provas produzidas apenas no Inquérito Policial, pois estas não passam pelo filtro do contraditório e da ampla defesa.


O CPP estabelece o mesmo princípio, vejamos:

“Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fundamentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não repetíveis e antecipadas.”


O Código de Processo Penal Comum vem estabelecer o mesmo princípio elencado no CPPM, apenas trazendo maiores detalhes para esclarecer que ninguém poderá ser condenado com base apenas em provas colidas no Inquérito, pois nele não há contraditório e ampla defesa.


O RDPM e a I-16-PM são omissos quanto ao julgamento baseado apenas nas provas produzidas na fase de investigação, mas estabelecem que nos casos omissos aplica-se o CPM e o CPPM, bem como deve prevalecer à norma hierarquicamente superior (artigo 2º, da I -16 PM).

Por fim diz o anexo III à Portaria do Cmt G Nº CorregPM-004/305/01, artigo 8º, inciso III:


“os atos probatórios serão realizados na presença do militar do Estado acusado ou do seu defensor, sendo a qualquer deles permitido perguntar e reperguntar às testemunhas, por intermédio do Presidente, de tudo, mantendo-se registros escritos.” (grifei).


O que significa dizer que aqui também restou consagrado que o acusado não pode ser punido com base em prova produzida sem o contraditório e a ampla defesa.

Diante de tudo o que foi exposto, não resta dúvida, o Inquérito Policial está para o Processo Penal assim como a Investigação Preliminar está para o Processo Disciplinar, ou seja, os dois guardam similitude.

Tendo em vista todos os princípios acima elencados, a começar pela Constituição, podemos dizer que assim como não é possível condenar alguém com base em provas contidas apenas no Inquérito Policial, também não é possível punir o militar apenas com base em provas colidas na Investigação Preliminar.

Portanto, uma decisão baseada apenas nas provas contidas na Investigação Preliminar deve ser reformada por insuficiência de provas, visto que em tais casos a prova não passou pelo crivo do contraditório e da ampla defesa, possuindo apenas força de indicio para instauração do processo, mas não tem força suficiente para fundamentar uma punição.

Neste sentido é a jurisprudência do STF:


"A garantia do direito de defesa contempla, no seu âmbito de proteção, todos os processos judiciais ou administrativos." (RE 426.147-AgR, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgamento em 28-3-2006, Segunda Turma, DJ de 5-5-2006.) Vide: RE 459.623-AgR, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 24-11-2009, Segunda Turma, DJE de 18-12-2009) – grifei-


“Ementa
INQUÉRITO - ELEMENTOS - CONDENAÇÃO. Surge insubsistente pronunciamento condenatório baseado, unicamente, em elementos coligidos na fase de inquérito.”
(HC 96356/RS - RIO GRANDE DO SUL).


Este é o nosso posicionamento, que não pretende esgotar a matéria, mas apenas enriquecer o debate.




[1] Cícero Robson Coimbra Neves, 1º ten PM servindo na Corregedoria da Polícia Militar de São Paulo, bacharel em Direito pela FMU, DIREITO PENAL MILITAR E PROCESSUAL PENAL MILITAR, Ano 3 - Volume 6, nº 3, Julho/dezembro 2004, “Caderno Jurídico”, co-edição ESMP/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, p. 191.

domingo, 28 de agosto de 2011

Atuação do Advogado no Conselho de Disciplina da PMESP

“O Conselho de Disciplina é o processo regular que visa apurar a incapacidade moral da Praça com 10 (dez) ou mais anos de serviço policial-militar para permanecer no serviço ativo, fornecendo subsídios para decisão final do Comandante Geral” [1].






Assim, “O Conselho será composto por 3 (três) oficiais da ativa. O mais antigo do Conselho, no mínimo um capitão, é o presidente, e o que lhe seguir em antigüidade ou precedência funcional é o interrogante, sendo o relator e escrivão o mais moderno. Entendendo necessário, o presidente poderá nomear um subtenente ou sargento para funcionar como escrivão no processo, o qual não integrará o Conselho”.[2]
Desta maneira, o oficial interrogante é quem fará as perguntas ao acusado e às testemunhas de acusação e defesa durante a instrução do processo.
Portanto, forçoso reconhecer que inevitavelmente haverá um embate entre o advogado do acusado e o oficial interrogante, e não é preciso dizer também que os demais membros do Conselho penderão a favor dos posicionamentos do oficial interrogante, tendo em vista o corporativismo e a solidariedade do oficialato.
Logo, comum que durante a oitiva de alguma testemunha o oficial interrogante tente “colocar palavras em sua boca”, busque, na ânsia punitivista, extrair da testemunha algo que em verdade ela não sabe, para que consiga o seu intento de punir o acusado.
É neste momento que o advogado irá intervir para evitar o abuso na investigação e evitar prejuízos ao seu cliente.
Contudo, não raro, o Conselho entende que tal atitude do advogado não encontra amparo legal, acreditando que o advogado deva ficar inerte e deixar o interrogante “espremer” à vontade a testemunha até que consiga que ela diga o que ele quer ouvir.
Ocorre que ao contrario do que pensam muitos oficiais, o advogado pode e deve interferir quando constata um abuso por parte do interrogante, vejamos:
O artigo 159, § 7º, da I – 16 PM, proíbe, por ocasião do interrogatório, que o defensor interfira nas respostas do acusado.
Porém, o artigo 179 do mesmo dispositivo legal permite que o advogado conteste a testemunha de acusação.
Ainda, o artigo 7º, inciso X, do Estatuto da OAB, que é lei Federal, diz que é direito do advogado usar a palavra “pela ordem” mediante intervenção sumária para esclarecer equivoco ou dúvida surgida em relação a fatos, documentos, ou afirmações que influam no julgamento, bem como para replicar acusação ou censura que lhe forem feitas.
Portanto, o defensor, conforme a I- 16 PM c/c o Estatuto da OAB, só esta impedido de interferir no interrogatório do acusado, mas poderá interferir sumariamente no depoimento da testemunha de acusação para esclarecer equívoco, dúvida, ou contestá-la.
E mais, é dever do advogado tomar providências contra abuso e excesso da ação investigatória, pois o destinatário da prerrogativa não é o causídico, mas o cidadão que é titular de direitos.


[1] I- 16 PM, Artigo 137
[2]  Artigo 78 do RDPM

Colidência de Defesas

A 6ª Turma do STJ decidiu que o mesmo advogado não pode defender teses contraditórias no processo.
O caso ocorreu em um julgamento de “Habeas Corpus” impetrado contra decisão do Conselho Especial de Justiça da 2ª Auditoria Criminal do Tribunal de Justiça Militar do Estado de São Paulo.
Durante o interrogatório dos réus, um dos militares imputou a outro militar de grau hierárquico superior a responsabilidade pelos fatos de que eram acusados.
Como os dois militares eram representados pelo mesmo advogado, o magistrado de primeiro grau instaurou o incidente de “colidência de defesas”, já que um réu aponta a responsabilidade ao outro, assim, o advogado teria que defender teses opostas.
O Conselho reconheceu o conflito de defesas.
O advogado inconformado impetrou o remédio heróico, alegando que a decisão foi arbitrária e violou as prerrogativas do exercício de sua profissão, configurando cerceamento de defesa.
O STJ entendeu que assistia razão o juízo militar, pois a decisão buscou evitar um mal maior à ampla defesa.
Na opinião da relatora Maria Thereza de Assis Moura: “Neste ponto, cumpre asseverar que o juiz penal, antes de mais nada, é um guardião das garantias constitucionais, exercendo, por isso, o poder de impedir o desvirtuamento da ampla defesa e de salvaguardar o processo justo”.[1]


[1] Jornal do Advogado, OAB/SP, nº 364 – Ano XXXVII – Agosto 2011, p. 22

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Lei 12.403/2011

A recentíssima lei causa certa polêmica na sociedade.
A nova legislação cuida da prisão preventiva, que é aquela que ocorre antes da sentença condenatória.
É determinada quando há risco de que o acusado fuja, ou esteja destruindo provas, ameaçando testemunhas, colocando em risco a ordem pública ou econômica.
Por se tratar de uma medida extrema deve ser aplicada com muita cautela e quando realmente necessária, pois coloca o acusado no cárcere antes de se ter certeza de sua culpa.
Veja a opinião de alguns juristas a respeito da nova lei e da prisão preventiva:

Além disso, o contato do preso cautelar com os demais presos do sistema é extremamente pernicioso. A cadeia é a universidade do crime. A prisão, por isso mesmo, tem que ser a última medida.” (Luiz Flavio Gomes, disponível em http://www.ipclfg.com.br/artigos-do-prof-lfg/lei-nova-pode-liberar-muitos-presos-cautelares).
“A ideia essencial é a substituição da prisão cautelar pelas medidas alternativas, tal como, hoje, se faz no contexto do Direito Penal, trocando-se a pena privativa de liberdade pela restritiva de direito. Trata-se da mesma política de desprisionalização, ou seja, reservar o cárcere – provisório ou não – para os casos realmente importantes.” (Guilherme de Souza Nucci, Revista Carta Forense, Edição nº 97, Junho de 2011, p, B 10)
“Não se pode banalizar a prisão, mormente no cenário provisório, quando ainda vigora o princípio constitucional da presunção de inocência” (Guilherme de Souza Nucci, Revista Carta Forense, Edição nº 97, Junho de 2011, p, B 10)

A nova lei (Lei 12.403/11), para além de prever 11 medidas cautelares alternativas, que devem ser analisadas pelo juiz, antes de decretar ou confirmar a prisão, acabou com a velha e inconstitucional praxe do ‘carimbão’ que, simplesmente, dizia: ‘Flagrante em ordem’. Colocava-se o ‘carimbão’ na papelada dos réus pobres e tudo prosseguia, sem percalços. Em relação aos ricos isso nunca jamais ocorreu impunemente.[...] Por força do novo art. 310, com redação dada pela Lei 12.403/11, a prisão em flagrante, quando o caso, deve ser convertida em prisão preventiva, inclusive em relação aos pobres, em decisão fundamentada (tríplice é a fundamentação: quais fatos justificam a prisão, qual é seu fundamento jurídico e se ela é realmente necessária). Para os ricos essas exigências sempre foram cumpridas pelos juízes. A fiscalização deles é muito mais efetiva.”

sexta-feira, 8 de julho de 2011

Sobre o ataque de hackers aos sites do governo brasileiro

Nos últimos dias os sites do governo brasileiro foram alvos de ataques de hackers, veja a opinião do especialista em direito digital Dr. Alexandre Atheniense:
A onda de ataques dos hackers a diversos sites do Governo Brasileiro demanda uma reflexão sobre quais seriam as vulnerabilidades tanto no aspecto de segurança da informação quanto da nossa legislação.
Mesmo diante da escassa informação técnica já divulgada pelos responsáveis dos sites atacados detalhando o alcance do dano causado, ao que parece, a natureza dos ataques visava, em regra, os seguintes objetivos: A pichação virtual “website defacement”, caracterizada pela quebra da proteção de segurança dos sites para efetivar uma mudança visual da aparência do site, com a troca de imagens e registro da marca do hacker que efetuou o ataque; a invasão da rede interna das entidades, via acesso não autorizado e consequente tentativa de furto de informações sigilosas; disparo de inúmeros acessos simultâneos originados de vários computadores, denominados zumbis, situados em localidades diversas, para sobrecarregar o sistema até derrubá-lo. Tais procedimentos são também conhecido por ataques de negação de serviços do tipo DDoS – Distributed Denial of Service ou DoS – Denial of Service.
É um equívoco imaginar que estes foram os primeiros ataques disparados contra estes sites. As iniciativas de proteção e enfrentamento aos incidentes de segurança da informação são medidas estratégicas de defesa imprescindíveis para qualquer entidade que se viu envolvida nestes atos. Porém, os recentes ataques, mesmo sendo considerados por alguns experts como sendo de limitado potencial danoso, evidenciaram novamente que os sites governamentais, ao contrário do que ocorre no setor bancário, ainda prescindem de investimentos de segurança da informação, para reduzir a vulnerabilidade, sobretudo quanto aos ataques de negação de serviços.
O combate a estes incidentes deverá ocorrer com o somatório da investigação de perícia forense para identificação dos indícios que poderão conduzir a identificação de autoria, que, caso seja alcançada, redundará em possíveis medidas judiciais a serem adotadas contra os hackers.
No meu ponto de vista, o maior desafio a ser enfrentado será a identificação de autoria. Embora seja uma tarefa difícil, mas não devemos considerar como impossível. É certo que em se tratando de ataques com o uso de diversos computadores, o exame deverá realizado pelos registros eletrônicos.
Estes poderão desvendar a origem geográfica dos ataques, que inclusive poderá ter sido simulada pelo uso de alguns recursos tecnológicos, além das mensagens publicadas sobre os ataques nas contas dos hackers no Twitter.
Embora este serviço não tenha sede no Brasil, o que o torna, a princípio, inalcançável por uma ordem judicial brasileira para fornecimento de dados cadastrais dos seus usuários, pode ser que venha a cooperar com as autoridades investigadoras brasileiras, conforme está previsto em seu termo de serviço. Certamente a investigação ora comandada pela Policia Federal e por alguns órgãos militares deverá contar com a colaboração de outros países.
Se a investigação identificar que um hacker seja domiciliado no exterior, teremos poucas chances de punição pela lei brasileira, pois inexiste tratados de extradição para estes crimes. Entretanto, se o mesmo for domiciliado no Brasil as chances de punição serão maiores.
Uma vez identificada a autoria quais seriam as punições cabíveis contra os hackers?
A análise do fato nos remete a avaliação que algumas condutas ainda prescindem de definição como crime pela legislação brasileira, enquanto que outras já poderão ser punidas.
As condutas que ainda não se tornaram crime na legislação brasileira estão previstas no PL 84/99, tramitando há 12 anos no Congresso Nacional. Não há estimativa de prazo para sanção deste projeto de lei devido a impasses políticos, sobretudo de manifestações de alguns grupos que defendem que o PL ainda não estaria maduro para ser votado, ou mesmo que o correto seria aguardar a tramitação do Projeto de Lei denominado Marco Civil da Internet ,que sequer ainda foi remetido para o Congresso Nacional.
As condutas ilícitas previstas no PL 84/99 que poderiam punir os hackers seriam: acesso não autorizado a sistema informatizado; obtenção, transferência ou fornecimento não autorizado de dado ou informação; divulgação ou utilização indevida de informações e dados pessoais; inserção ou difusão de código malicioso; Interrupção ou perturbação de serviço informático; falsificação de dados eletrônicos públicos ou particulares; estelionato eletrônico; dano a dado eletrônico alheio e atentado contra serviços de utilidade pública.
Entretanto, outras condutas já poderiam ser imputadas contra os infratores, com base no artigo 265 do Código Penal, que pune aquele que atentar contra a segurança ou serviço de utilidade pública. O crime prevê pena de reclusão de 1 a 5 anos e multa.
Se desta invasão tiver ocasionado danos a infraestrutura do site ou da rede interna dos sistemas, poderá incidir o crime de dano previsto no artigo 163 do Código Penal, cuja punição será de 1 a 6 meses e multa. Se constatada a vulnerabilidade da reputação das instituições envolvidas no ataque, poderá ainda ocorrer a incidência de reparação de danos materiais e morais.
Caso estas invasões tenham possibilitado o acesso dos hackers a dados sigilosos, este resultado poderá concorrer para que estes venham a obter vantagens ilícitas a partir destas informações. Nestes casos poderão estar sujeitos a diversas penalidades, tais como: divulgação de segredo, preceituado no artigo 153 do Código Penal, cuja pena é de detenção de um a seis meses, ou multa; extorsão, artigo 158, pena de reclusão de quatro a dez anos e multa; estelionato, artigo 171, com reclusão de um a cinco anos e multa.
As lições que se depreendem desta onda de ataques cibernéticos, é que os sites governamentais estão mais vulneráveis que os bancos para enfrentar estes incidentes e demandam maior investimento em segurança da informação. A identificação de autoria pode ser difícil, mas não é impossível. A aplicação da lei brasileira só será possível se os hackers identificados tiverem domicílios no Brasil. A legislação brasileira pode punir algumas condutas que poderão acontecer em decorrência do resultado dos ataques e não o ato propriamente dito.
Mesmo que admitamos que os hackers tenham atacados os sites governamentais com objetivo de expor as vulnerabilidades dos sistemas de proteção de dados e não para furtar dados sigilosos, ou danos de maiores, é inegável que estes concorreram, ainda que de forma imotivada, para pautar a necessidade do Congresso Nacional de desatar o nó político que se criou nos últimos tempos para finalizar a tramitação do projeto de lei de crimes cibernéticos.
É certo que o Poder Legislativo Brasileiro tem uma tradição de acelerar os trâmites dos Projetos de Lei a partir de alguns escândalos midiáticos, mas a meu ver, nada justifica mais uma vez, o retardamento da tramitação do Projeto de Lei de Crimes Cibernéticos, em detrimento da aprovação do Marco Civil da Internet cuja remessa ao Congresso sequer ainda ocorreu.
Não discuto a inegável importância do Marco Civil cujo debate está focado na necessária proteção de dados do cidadão brasileiro, mas se analisarmos o regimento interno do Congresso Nacional, concluiremos que a versão atual do Projeto de Lei de Crimes Cibernéticos, teve recentemente sua redação alterada para a supressão de alguns artigos devido a um acordo político e adequação da linguagem tecnológica.
Entretanto, é importante frisar que não será possível nova modificação do texto do PL 84/99 para inserção de novas condutas ilícitas ou alteração da dosimetria das penas já preceituadas.
A insegurança jurídica que o cidadão brasileiro convive com as fraudes eletrônicas demanda que a tramitação do PL 84/99 prossiga após a realização nova audiência pública designada para o mês de julho, para votação em Plenário no mês de agosto e posterior sanção presencial.
Até quando os estratosféricos prejuízos de 900 milhões de reais, originado pelas fraudes eletrônicas divulgados pela FEBRABAN e as humilhações destes atentados e pichações virtuais não serão suficientes para que possamos ter uma lei que possa punir estes ilícitos?
* Todos os direitos reservados. Os direitos autorais deste blog pertencem à Alexandre Atheniense. Reprodução deste artigo autorizada mediante citação do blog DNT e do nome do autor.”  1

sexta-feira, 17 de junho de 2011

CONSUMIDOR X IGREJA


Abaixo segue notícia retirada do site do Tribunal de Justiça de São Paulo, trata-se de um caso peculiar, confesso que ainda não tinha me deparado com tal hipótese, é uma ação movida por um consumidor contra a igreja onde casou.

Assim, transcrevo a notícia:


"Consumidor ressarcido por pagar a igreja valor indevido

        O juiz Pedro Paulo Maillet Preuss, do Juizado Especial Cível do Foro Regional VIII – Tatuapé, julgou parcialmente procedente, no último dia 1º, pedido de indenização por dano material a consumidor em ação movida por ele contra uma igreja.
       
 O autor da ação foi multado em R$ 800 por não utilizar os serviços de fotografia e/ou filmagem credenciados pela igreja onde se casou.

        O magistrado, em sua decisão, fundamenta que ‘conforme disposição expressa do artigo 39, inciso I, da Lei 8078/90, veda-se, em sede do direito pátrio, o condicionamento do fornecimento de um produto ou serviço à contratação de outro. A vedação a que empresas de fotografia e/ou filmagem não credenciadas pela igreja sejam contratadas e que, caso tal venha a ocorrer, preveja-se a apenação com multa importa em modo transverso de lavor em descumprimento ao preceito legal mencionado. Nesse diapasão, em que pese os louváveis argumentos expendidos na contestação ou em audiência, não há como se negar a inclusão de tal proceder dentro das práticas abusivas da relação de consumo estabelecida entre as partes’.

        Em relação ao dano moral o juiz concluiu: ‘...não se pode, sob risco de se imprimir caráter lotérico, panaceico e/ou argentário, outorgar-se dano moral para a hipótese narrada na vestibular, salientando-se sobre o tema que o mero dissabor, aborrecimento, mágoa, irritação ou sensibilidade exacerbada estão fora da órbita do dano moral’.

        A igreja foi condenada a pagar a quantia de R$ 800, corrigido monetariamente pela Tabela Prática do Tribunal de Justiça desde a distribuição, com juros de mora de 1% ao mês a partir da citação.”

(Processo nº. 0013395-89.2010.8.26.0008 Assessoria de Imprensa TJSP –(texto)        imprensatj@tjsp.jus.br)[1]


[1]  http://www.tj.sp.gov.br/Noticias/Noticia.aspx?Id=10806

quinta-feira, 9 de junho de 2011

Greve dos Bombeiros no Rio de Janeiro


A Justiça decidiu manter a prisão dos Bombeiros.

Assim decidiu a Juíza Auditora:

“A juíza Ana Paula Monte Figueiredo Pena Barros, da Auditoria da Justiça Militar do Rio, negou na noite desta quarta-feira, dia 7, o relaxamento da prisão dos 431 bombeiros que foram detidos no último sábado, após a invasão do Quartel-General da corporação. O pedido havia sido feito pela Defensoria Pública do Estado.

 Na decisão, a juíza concluiu não haver qualquer nulidade no auto de prisão em flagrante. Segundo ela, ‘a custódia cautelar de todos os militares mostra-se imprescindível à garantia da ordem pública, por conveniência da instrução criminal e para a manutenção dos princípios da hierarquia e da disciplina militares, que se encontram flagrantemente ameaçados’.

 Ainda de acordo com a juíza, ao invadir o Quartel-General, desrespeitar seus superiores e danificar o patrimônio público, subvertendo a ordem assegurada pela Constituição, e exigindo a intervenção da Polícia Militar para a retomada da unidade, os bombeiros extrapolaram, e muito, seu exercício do direito de lutar por melhores condições de vida pessoal e profissional.

 ‘Deste modo, eventual liberdade dos militares, ao menos neste momento, certamente fortaleceria a pecha deste movimento reivindicatório, não apenas com a ocupação de logradouros importantes da capital fluminense, trazendo transtornos à vida do cidadão comum que, apesar do apoio aos bombeiros, nada pode fazer para atender a seus anseios, mas também aumentaria ainda mais a certeza da impunidade daqueles militares que, sob o discurso insuflado e apaixonado – mas desprovido da razão – proferido por líderes cuja prisão já fora decretada anteriormente por este Juízo por suposta prática de incitamento à prática de crimes militares, podem servir novamente como ‘massa de manobra’ e promover outros atos inaceitáveis, em detrimento da população civil em geral, pondo, evidentemente, em risco a ordem pública’, justificou. ”[1]

O protesto dos Bombeiros Cariocas me fez lembrar outro movimento militar, segue um breve relato:

“Por Miriam Ilza Santana

A REVOLTA DA CHIBATA ocorreu durante o governo de Hermes da Fonseca, em 1910. Foi um levante de cunho social, realizado em subdivisões da Marinha, sediadas no Rio de Janeiro. O objetivo era por fim às punições físicas a que eram submetidos os marinheiros, como as chicotadas, o uso da santa-luzia e o aprisionamento em celas destinadas ao isolamento. Os marinheiros requeriam também uma alimentação mais saudável e que fosse colocada em prática a lei de reajuste de seus honorários, já votada pelo Congresso. 

De todos os pedidos requeridos, o que mais afligia os marujos eram os constantes castigos a que eram sujeitos. Esta situação revoltou os marinheiros, que eram obrigados, por seus comandantes, a assistir a todas as punições aplicadas, para que elas servissem de exemplo. Os soldados se juntavam e ao estampido de tambores traziam o rebelado, despido na parte de cima e com as mãos atadas, iniciando o castigo.

A sublevação deu-se quando um marinheiro de nome Marcelino Rodrigues levou 250 chicotadas por ter machucado um companheiro da Marinha no interior do navio de guerra denominado Minas Gerais, que se encontrava a caminho do Rio de Janeiro. Os rebelados assassinaram o capitão do navio e mais três militares. Enquanto isso, na Baía de Guanabara, os insurgentes conseguiram a adesão dos marujos da nau São Paulo. 

O condutor da insurreição, João Cândido – o célebre Almirante Negro –, foi o responsável por escrever a missiva com as solicitações exigidas para o fim da revolta. 

O presidente Hermes da Fonseca percebeu que não se tratava de um blefe e decidiu ceder diante do ultimato dos insurgentes. Os marinheiros confiaram no presidente, entregaram as armas e os navios rebelados, mas com o término do conflito o governante não cumpriu com a sua palavra e baniu alguns marinheiros que haviam feito parte do motim. Os marinheiros não se omitiram diante deste fato, estourando outro levante na ILHA DAS COBRAS, o qual foi severamente abafado pelas tropas do governo. Muitos marujos morreram, outros tantos foram banidos da Marinha. Quanto a João Cândido, foi aprisionado e atirado em um calabouço na Ilha das Cobras. Quando se livrou da prisão, encontrava-se emocionalmente amargurado, considerado até mesmo meio alucinado. Em 1912 ele foi julgado e considerado inocente. Historicamente ficou conhecido como o Almirante Negro, aquele que aboliu o uso da chibata na Marinha brasileira. ”[2]

“[...] podemos considerar a Revolta da Chibata como mais uma manifestação de insatisfação ocorrida no início da República. Embora pretendessem implantar um sistema político-econômico moderno no país, os republicanos trataram os problemas sociais como “casos de polícia”. Não havia negociação ou busca de soluções com entendimento. O governo quase sempre usou a força das armas para colocar fim às revoltas, greves e outras manifestações populares. ”[3]

Do mesmo modo que os marinheiros revoltosos, os 439 Bombeiros presos no Rio, provavelmente, serão expulsos da corporação, ainda, pelas declarações das autoridades envolvidas, terão que encarar processos criminais na Justiça Militar.

Os homens em questão feriram os dois principais dogmas de qualquer corporação militar, a hierarquia e a disciplina, e dificilmente irão escapar ilesos por tamanho pecado.

Além disto, os Bombeiros violaram dispositivos Constitucionais que proíbem a greve aos militares, bem como responderão por uma “coleção” de crimes militares (por exemplo, motim).

Pelo visto, a história irá se repetir teremos 439 João Cândido” presos e execrados de sua corporação.

O governo da moderna era digital, do ano de 2011, continua a agir como ao governo do século passado (1910), tratando os problemas sociais como “casos de polícia”.

E a Chibata da hierarquia e disciplina continua a castigar os militares do Brasil...


[1]  Disponível no site http://portaltj.tjrj.jus.br/, em 09/06/2011
[2] http://www.infoescola.com/historia/revolta-da-chibata/  (grifei)
[3] http://www.suapesquisa.com/historiadobrasil/revolta_chibata.htm  (grifei)